segunda-feira, 5 de agosto de 2013

João Pessoa nasceu longe do mar por estratégia militar, diz especialista

Cidade de João Pessoa nasceu às margens do Rio Sanhauá (Foto: Juliana Brito/G1)
Cidade de João Pessoa nasceu às margens do Rio
Sanhauá (foto de: Juliana Brito/G1-PB)
 
Nascida às margens do Rio Sanhauá, há 428 anos, ainda com o nome de Nossa Senhora das Neves, a cidade de João Pessoa percorreu o caminho inverso de muitas cidades litorâneas do Brasil, que se constituíram e se desenvolveram da costa para o interior. Somente a partir dos anos 1940, com a segunda intervenção urbanística na Lagoa do Parque Solon de Lucena, a capital paraibana começou a crescer em direção ao mar.

Para o arquiteto e diretor técnico da Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Umbelino Peregrino, a construção da cidade de João Pessoa a quase 10 km de distância da costa pode ser considerada “uma das estratégias de defesas mais perfeitas”, adotada pela Coroa portuguesa, após a conquista do território.

“A questão da defesa, eu acho que foi o motivo primeiro. Não foi por menos que, só depois da terceira tentativa que se conseguiu a invasão (pelos holandeses, no século XVII). Era um dos melhores sistemas de defesa da América Latina”, afirmou Peregrino, ressaltando que a maioria das cidades litorâneas teve seu núcleo de crescimento no litoral.

De acordo com o diretor técnico do Iphan na Paraíba, a partir do final do século XVII e início do século XVIII, com a expulsão dos holandeses, a Coroa portuguesa iniciou um processo de retomada do território. Toda a movimentação passou a se concentrar nas regiões conhecidas como ‘cidade alta’ (centro religioso, administrativo e financeiro, da elite) e ‘cidade baixa’ (núcleo comercial e mais popular).
Gilvan de Brito é autor de livro que conta histórias do Parque Solon de Lucena (Foto: Juliana Brito/G1)
Gilvan de Brito é autor de livro que conta histórias do
Parque Solon de Lucena (Foto: Juliana Brito/G1)
Os moradores passaram a frequentar a área do atual Centro da cidade com maior regularidade somente na primeira metade do século XX, após as duas mais importantes intervenções urbanísticas realizadas na região central de João Pessoa, em 1920 e em 1940.

O foco foi a urbanização da área alagadiça da então ‘Lagoa dos Irerês’, que virou o Parque Solon de Lucena, segundo informou o jornalista e pesquisador Gilvan de Brito. “Foi quando iniciou a expansão da cidade na direção leste (região litorânea), que se intensificou nos anos 1950 e 1960”, declarou.


Avenida Epitácio Pessoa
O ápice dessa expansão da capital em direção ao mar se deu a partir do calçamento da Avenida Epitácio Pessoa, em 1952, quando o acesso à praia de Tambaú foi facilitado. A via foi aberta em 1929, pelo presidente João Pessoa, sob a denominação de ‘Estrada de Tambau’.

Porém, a locomoção entre o Centro e a praia – que já abrigava uma vila de pescadores, a capela de Santo Antônio e um hospício – era feita pela Ferrovia Tambau, que ia da Cruz do Peixe (onde funciona a ‘Usina Cultural Energisa’) somente até o sítio Imbiribeira – hoje, o bairro Tambauzinho.
Avenida Epitácio Pessoa foi corredor usado no crescimento rumo à praia. (Foto: Mauricio Melo/G1-PB)Avenida Epitácio Pessoa foi corredor usado para
crescer rumo à praia. (Foto: Mauricio Melo/G1-PB)
As informações fazem parte do livro ‘Ruas de Tambaú’, de autoria de Deusdedit Leitão e foram fornecidas pelo pesquisador e presidente do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano (IHGP), Joaquim Osterne Carneiro. Segundo a pesquisa realizada por Leitão, posteriormente, foi implantada uma linha de bondes movidos a gasolina, em substituição à antiga forma de transporte.

Ainda de acordo como o estudo, em seguida, ônibus passaram a fazer o transporte de passageiros, do Centro à praia de Tambaú, que já era frequentada por banhistas e veranistas. O processo de expansão da Avenida Epitácio Pessoa ocorreu a partir do surgimento dos bairros Santa Júlia, Torre, Expedicionários, Tambauzinho e Miramar, que se desenvolveram ao longo da via.

A pavimentação e posterior expansão da Avenida Epitácio Pessoa acompanharam uma onda de urbanização iniciada no final do século XIX, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, que tomou conta do Brasil naquele período, visando à modernização e ‘higienização’ das cidades, de acordo as informações fornecidas pelo IGHP.

Segundo o jornalista e pesquisador Gilvan de Brito, autor do livro ‘Opus Diaboli: a Lagoa e outras tragédias’, a abertura de vias importantes para a ligação do Centro à região litorânea e a segunda intervenção urbanística realizada na Lagoa do Parque Solon de Lucena, em 1940, contribuíram significativamente para o deslocamento da cidade de João Pessoa em direção ao mar.
Orla de Tambaú era mão dupla (Foto: Acervo Arion Farias)
Nos anos 70, casas de pescadores e de veranistas
fizeram a ocupação da praia de Tambaú
(Foto: Acervo Arion Farias)
“Aquelas obras, da estrutura mesmo – porque ali era só uma lagoa e tinha muita lama ao redor –, foram um marco para o crescimento de João Pessoa na direção leste (onde está localizada a região litorânea da capital). A construção da Avenida Getúlio Vargas, nesse mesmo período, contribuiu para movimentar a região e para o crescimento em direção à orla”, declarou Gilvan de Brito.

O responsável pelo loteamento de grande parte da região de Tambaú foi o comerciante Antônio de Brito Lyra, conforme a publicação do pesquisador Deusdedit Leitão. Em 1971, foi inaugurado o Hotel Tambaú, primeiro hotel de luxo da capital, que preencheu uma lacuna existente na cidade.

Até então, as autoridades, artistas e atletas que visitavam João Pessoa ficavam acomodados na residência dos empresários Creusa e Adrião Pires, segundo conta o advogado Marcos Pires, filho mais velho do casal. A ‘mansão dos Pires’ foi construída na Avenida Epitácio Pessoa, em 1965 – em um período em que a elite local passou a deslocar do Centro para morar na principal via da cidade, localizada próximo à praia.

Hotel Tambaú, em João Pessoa (Foto: Felipe Gesteira/Secom-JP)
Hotel Tambaú, construído em 1971 marcou a total
ocupação do bairro (Foto: Felipe Gesteira/Secom-JP)
Atualmente, a praia de Tambaú é a mais frequentada por turistas e moradores de João Pessoa, sendo apontada como uma das mais valorizadas pelo setor imobiliário. O metro quadrado no bairro de Tambaú custa R$ 6 mil, segundo o Sindicato da Indústria da Construção Civil de João Pessoa (Sinduscon-JP), com base na mais recente Pesquisa de Mercado do Setor de Lançamentos Imobiliários, divulgada em maio passado pelo consultor imobiliário Fábio Henriques.

Na região, estão concentrados a ‘Feirinha’, o Centro Turístico e o Mercado de Artesanato Paraibano, além de bares, restaurantes, lanchonetes e opções de lazer, tais como: ciclovia e espaços para a prática de esportes como vôlei de praia, futebol, skate e corrida. A orla de Tambaú também é o ponto de partida para passeios de barco até o banco de corais conhecido como ‘Picãozinho’, que fica a 15 minutos da costa.

Juliana Brito - G1/PB

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